A Blockchain vai acabar com os cartórios?

A Blockchain vai acabar com os cartórios?

Atualizado em 1 de fevereiro de 2021 por washington

A blockchain surgiu há cerca de uma década como a tecnologia por trás dos bitcoins. Mas, ao longo do tempo, além do surgimento de novas criptomoedas, outras aplicações foram descobertas. Sua utilização levantou o debate sobre a modernização e a facilitação de diversos procedimentos. Mas será que o uso dessa tecnologia coloca em risco todo o modelo de trabalho dos cartórios tradicionais?

O QUE É BLOCKCHAIN

Em resumo, a blockchain é uma tecnologia que teve mais evidência a partir de 2008, com o bitcoin aparecendo como forma de contraposição ao modelo de pagamentos tradicional, propondo um sistema de transações digitais sem intermediários e diretas entre as partes. Suas características permitem maior segurança e sigilo aos procedimentos, uma vez que tornam extremamente difícil a violação e divulgação de suas informações, como fazem os intermediários bancários tradicionais.

O TRABALHO DOS CARTÓRIOS

o trabalho nos cartóriosOs cartórios, ou Serviços Notariais e de Registro, podem ser definidos como os serviços “de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos”.    Assim, os cartórios estão diretamente relacionados à garantia dos princípios da Segurança Jurídica. Esses princípios definem a confiança e previsibilidade aos atos jurídicos, além da Publicidade que dá transparência aos mesmos atos. Tradicionalmente, quando uma pessoa precisa registrar um ato, ela precisa deslocar-se até o cartório correspondente. Isso se aplica aos mais diversos atos da vida pública, desde o registro de nascimento e falecimento, a compra ou venda de imóveis ou a cessão de um crédito, como os precatórios.

O procedimento tradicional implica muitos custos. Não só referentes ao deslocamento do indivíduo ao cartório correspondente, mas também à própria compreensão dos documentos e procedimentos necessários para o registro. Muitas vezes, o indivíduo não sabe qual o cartório responsável por determinado registro ou quais os documentos exigidos para fazê-lo.

Assim, tem ganhado cada vez mais força a tendência de digitalização de processos. Hoje, já é possível realizar a assinatura de documentos ou emitir certidões judiciais por meio da internet, algo impensável não tanto tempo atrás.

Mas qual a relação dessa discussão com a blockchain?

AS NOVAS APLICAÇÕES DA BLOCKCHAIN

Embora o uso tradicional da blockchain tenha sido a criação de criptomoedas, outras utilidades já foram encontradas para a tecnologia. A validação de documentos e de votos eleitorais são algumas das novas destinações para a blockchain que têm sido estudadas atualmente.

Luiz Neto, líder do Corporate Innovation no Vale do Silício, afirma que:

Esta tecnologia irá disruptir [sic] com o modelo que os cartórios atuam pois ela age como um livro de contas digital, confiável, imutável, visível para todos os participantes, que mostra todos os elementos da transação de forma transparente e por um custo extremamente barato.

Isso ocorreria porque a blockchain é capaz de centralizar os diversos registros de uma transação, de forma mais rápida e barata, eliminando os muitos intermediários usados atualmente. Seria possível, portanto, utilizar essa tecnologia para realizar o trabalho feito atualmente pelos cartórios.

As vantagens dessa substituição vão além da mera economia de tempo e de dinheiro. Segundo Satoshi Nakamoto, pseudônimo do idealizador da tecnologia por trás da blockchain, o sistema de pagamentos atual é baseado na confiança. Isso porque todas as operações passam por um intermediário (seja um advogado, um cartório, um banco ou uma operadora de cartões de crédito, por exemplo). Seria necessário, consequentemente, que as partes confiassem que esses intermediários executariam suas tarefas da forma correta e sem irregularidades.

A blockchain eliminaria essa necessidade. As operações diretas entre as partes, garantidas por um sistema de criptografia altamente seguro, não só tornaria esses intermediários desnecessários, mas estaria menos permeável a erros ou irregularidades.

O CASO DOS CARTÓRIOS

Mesmo com todos os argumentos levantados acima, a blockchain não implica necessariamente na extinção dos cartórios. Na verdade, ela fornece a tecnologia para sua modernização, de forma a facilitar o fornecimento dos serviços oferecidos. Isso é o que podemos perceber do discurso de Carl Amorim, executivo do Blockchain Institute no Brasil:

(…) ninguém detesta os cartórios, mas sim o processo burocrático e centralizado em que cada cartório é um ente isolado (…) Mas e se os cartórios tivessem seus sistemas conectados a um blockchain, onde os documentos ficassem registrados e só precisassem ser autenticados uma única vez e, toda vez que necessários, pudessem ser fornecidos por meio de um link, com um pagamento na casa de centavos e não de dezenas de reais? E se esse sistema permitisse que, em qualquer um dos 15 mil cartórios do Brasil, o cidadão tivesse acesso a suas certidões e documentos independente de onde foram registrados? [recorte nosso]

Os questionamentos feitos por Amorim demonstram que, ao invés de eliminar a necessidade dos cartórios, a blockchain poderia fazer seus serviços se tornarem mais eficazes.

De fato, na prática, a completa eliminação de cartórios e outros intermediários não seria viável. Embora o registro das operações na blockchain seja de acesso público, apenas as partes de cada operação têm acesso a seu conteúdo integral. Isso inviabiliza a publicidade que envolve necessariamente certos atos públicos, muitos deles registrados em cartórios. A não ser que seja utilizada uma blockchain totalmente pública, pois, nesse caso, é possível verificar as informações das transações.

Além disso, a tecnologia ainda não está plenamente adaptada a seus novos usos. Muitas empresas, inclusive grandes bancos, como o JP Morgan, têm estudado como podem utilizar a blockchain para melhorar seus procedimentos. Nesse sentido, Fábio Dutra, ex-diretor da Bovespa (atual B3), afirma que “Os sistemas ainda não estão estáveis o suficiente para uso comercial em larga escala”.

O FUTURO DOS CARTÓRIOS

Futuro

A blockchain é considerada uma tecnologia revolucionária por criar novas possibilidades de negócios, como o comércio de criptomoedas, e permitir o aperfeiçoamento de operações antigas. Gradualmente são encontradas novas aplicações e nem todas já plenamente adaptadas. Os cartórios se inserem nesse contexto na medida em que muitas de suas funções poderiam ser realizadas com maior eficiência se fizessem uso dessa tecnologia.

Embora muitos sejam os argumentos a favor da completa substituição dos cartórios tradicionais por modelos baseados em blockchain, também não são poucos os empecilhos a essa proposta. No fim, não seria necessário criar uma oposição entre os dois modelos, sendo mais provável que os cartórios sigam o exemplo de outros setores e usem a blockchain como forma de aperfeiçoar seus procedimentos, trazendo maior qualidade a seus serviços e maior satisfação a seus destinatários.

Sobre este tema aproveite para ler o nosso post: Blockchain no Direito?

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