Atualizado em 3 de julho de 2020 por lorenna
Os precatórios representam o reconhecimento de uma dívida da Fazenda Pública, que deve ser paga por meio de um regime diferenciado. Entretanto, a Administração Pública é composta por diversos entes, sendo dividida entre Administração Direta e Administração Indireta. Como se dá, então, o regime de pagamentos da Administração Indireta?
A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL
A Administração Direta representa um conjunto de órgãos que integram o Estado de forma centralizada. Por sua vez, também existem entidades que praticam as atividades administrativas de forma descentralizada, compondo a Administração Indireta.
O Decreto-Lei nº 200/1967, que organiza a Administração Pública Federal, dispõe que:
Art. 4° A Administração Federal compreende:
I – A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios.
II – A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria:
- a) Autarquias;
- b) Empresas Públicas;
- c) Sociedades de Economia Mista.
- d) fundações públicas.
Percebemos que foram previstas, então, quatro entidades pertencentes à estrutura da Administração Pública Indireta. O Decreto-Lei nº 200/1967 recebeu várias críticas por deixar de incluir certas entidades consideradas pertencentes à Administração Indireta, como as concessionárias, assim como por adotar um sentido restrito das sociedades de economia mista e das empresas públicas.
A ADMINISTRAÇÃO INDIRETA
Agora, deixando de lado eventuais debates acadêmicos, vamos discutir, então, o que são as entidades da Administração Indireta previstas no Decreto.
Em relação à personalidade jurídica, percebemos que as autarquias são sempre pessoas de direito público, enquanto as empresas públicas e as sociedades de economia mista são sempre pessoas de direito privado. Por sua vez, as fundações podem ser pessoas de direito público ou privado.
Mas o que diferencia estas entidades?
As autarquias são entidades autônomas, criadas por lei específica, destinadas a desempenhar atividades típicas da administração pública. Sua criação é justificada pela necessidade de gestão descentralizada para seu melhor funcionamento.
As fundações públicas representam um patrimônio dotado de personalidade jurídica própria, destinado a exercer uma atividade de interesse social.
Dessa forma, as semelhanças entre as autarquias e as fundações públicas é que ambas não possuem fins lucrativos e seus funcionários são, em regra, estatutários.
Por outro lado, as empresas públicas são autorizadas por lei e criadas com patrimônio exclusivamente público, para explorar atividades econômicas ou prestar serviços públicos.
Finalmente, as sociedades de economia mista são compostas por capital público e privado, sendo criadas sob a forma de sociedade anônima. Também estão destinadas a explorar atividades econômicas ou prestar serviços públicos, ficando seu controle acionário nas mãos da entidade que as criou.
Diferentemente das autarquias e fundações, os empregados das empresas públicas e das sociedades de economia mista são, em regra, celetistas.
AS DÍVIDAS DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA
A Constituição Federal prevê a aplicação do sistema de precatórios à Fazenda Pública. Desta feita, em regra, esse sistema não se aplicaria a pessoas jurídicas de direito privado. Entretanto, muito se debate acerca do regime aplicável às entidades da Administração Indireta.
A CF/88 também prevê, em seu artigo 173, § 1º, inciso II, que:
1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
(…)
II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; [grifos nossos]
Assim, seria esperado que as empresas públicas e sociedades de economia mista, enquanto entidades de direito privado, fossem sujeitas ao regime aplicável às empresas privadas. Não haveria que se falar, portanto, em precatório com relação a essas entidades.
Todavia, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar caso contra a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, empresa pública, decidiu que:
Empresa pública que não exerce atividade econômica e presta serviço público da competência da União Federal e por ela mantido. Execução. Observância ao regime de precatório, sob pena de vulneração do disposto no artigo 100 da Constituição Federal” (RE 220.906)
Neste caso, vale ressaltar que a empresa atuava sob regime de monopólio. Essa particularidade é relevante e foi destacada em outro julgado do STF. Em relação à Eletronorte, o Tribunal modificou sua posição anterior, ao afirmar:
Os privilégios da Fazenda Pública são inextensíveis às sociedades de economia mista que executam atividades em regime de concorrência ou que tenham como objetivo distribuir lucros aos seus acionistas. Portanto, a empresa Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. (ELETRONORTE) não pode se beneficiar do sistema de pagamento por precatório de dívidas decorrentes de decisões judiciais (art. 100 da Constituição)” (RE 599.628)
Somente em 2017 o tema foi pacificado, quando o STF analisou a ADPF 387/PI. O Tribunal afirmou que o regime dos precatórios é aplicável às sociedades de economia mista que prestem serviços públicos próprios do Estado, desde que esses serviços não possuam natureza concorrencial. Ou seja, desde que as sociedades dessa natureza atuem sob regime de monopólio, sem enfrentarem empresas concorrentes no mercado.
MONOPÓLIO E IMPENHORABILIDADE
De toda a discussão acima, podemos chegar a algumas conclusões. Às pessoas jurídicas de direito público, aí incluídas as autarquias e fundações públicas, é aplicado o regime de precatórios.
Com relação às sociedades de economia mista e empresas públicas, em regra, não se aplica o regime de precatórios. Entretanto, os bens dessas entidades que estejam destinados à prestação de serviços públicos, ainda que privados, são considerados impenhoráveis.
Para que empresas públicas e sociedades de economista mista sejam inseridas no regime dos precatórios, é preciso que sujeitem-se a alguns requisitos. Conforme jurisprudência do STF, elas devem prestar serviço público típico do Estado; tenham natureza não concorrencial; e o objetivo fundamental não seja a obtenção de lucro.
EXEMPLOS DE EMPRESAS
A Administração Pública Brasileira atua, simultaneamente, de forma centralizada e descentralizada. Considerando as particularidades das entidades da Administração Indireta, surgem debates em torno da aplicação do regime de precatórios. Embora o próprio STF já tenha modificado seu posicionamento inicial acerca do tema, a melhor compreensão dos conceitos envolvidos facilita a análise dos casos concretos.
Dessa forma, embora a Petrobras esteja presente na foto de capa, não existem precatórios da empresa. Por outro lado, é possível identificar muitos precatórios cujo devedor são empresas públicas ou sociedades de economia mista. Dentre elas podemos citar algumas federais como: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, Empresa Brasileira de Turismo, Empresa Brasileira de Infraestrutura aeroportuária (INFRAERO). De autarquias federais, podemos dar como exemplo: Banco Central do Brasil, IBAMA, Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL).
O QUE ACONTECE SE ELAS FOREM PRIVATIZADAS?
Neste caso há que se considerar duas situações:
1ª precatório é expedido antes da privatização
Se o precatório é expedido e posteriormente a empresa é privatizada seu precatório continua existindo. O trânsito em julgado da sentença condenatória ocorreu contra a empresa mista e sobre ela vai recair a dívida.
Uma vez que precatório não é extinto em virtude da privatização, resta saber quem é o responsável por pagá-lo. Neste caso a União poderá assumir as dívidas da empresa ou as dívidas judiciais serem incluídas no processo de negociação. Por exemplo, o valor de mercado da companhia é 100 bilhões mas possui 5 bilhões em precatórios a pagar. Dessa forma, o comprador fará a aquisição por 95 bilhões e o restante entrará como passivo.
2ª empresa é privatizada antes da expedição do precatório
Caso a privatização ocorra no curso do processo judicial, ou seja, antes da conclusão da fase de cumprimento de sentença ou até mesmo da sentença de mérito condenatória, ainda deverá ser expedido precatório.
O autor do processo judicial ainda receberá por precatório pois o polo passivo da ação é empresa mista, desde que a companhia se enquadre nos critérios já apresentados. A privatização não apaga o passado da empresa privatizada e nestes casos a União é a responsável por arcar com esses débitos, posto que se tornaram líquidos e certos após o término do processo de compra.